Um 8 de março para tempos de guerra

Por Wilma dos Reis (*)

O Dia Internacional de Luta das Mulheres, 8 de março, está próximo e as reuniões para a construção dos atos em todo o Brasil já começaram.

É importante entendermos a importância da data e seu potencial de mobilização e diálogo com vários setores da sociedade.

Mais ainda, compreender a conjuntura em que vivemos e traduzi-la nas chamadas, nas construções do 8 de março e, principalmente, nos atos que acontecerão no Brasil.

Essa construção deve traduzir o acirramento da resistência que as mulheres estão construindo desde 2015, frente à ofensiva ultraneoliberal e o conservadorismo capitalista patriarcal racista.

Desde o golpe parlamentar e patriarcal de 2016, a classe trabalhadora enfrenta a entrega e privatização dos nossos recursos naturais e das estatais, o desmonte das políticas de seguridade social, bem como a retirada de direitos trabalhistas e previdenciários, a criminalização das lutas sociais, a agressão contra a cultura e a educação, o aumento da repressão policial nas periferias e o aprofundamento do conservadorismo em todos os âmbitos da vida.

Isto não é só uma política de precarização, é uma política de morte e as mulheres estão no centro do ataque.

Não bastasse essas e outras formas de violência que atingem gradativamente a população mais pobre do país, o presidente ilegítimo incita diariamente diversas formas de violência contra setores da sociedade já em situação de vulnerabilidade dada às opressões e explorações históricas .

As mulheres sofrem diretamente essas violências, já que chefiam quase 29 milhões das famílias brasileiras, cumprem várias de jornadas de trabalho, principalmente o trabalho doméstico e de cuidados que são invisibilizados e considerados improdutivos, estão sendo empurradas para a informalidade e trabalhos ainda mais precários e com baixos salários, e agora terão que trabalhar mais para tentar se aposentar.

Salientando que essa realidade é mais cruel para as mulheres negras.

São as mulheres que mais procuram os serviços de saúde e assistência social e com os desmontes dessas políticas aprofunda-se ainda mais a situação de vulnerabilidade dessas mulheres e daquelas/es que dependem diretamente delas, como crianças, pessoas com deficiência e idosas/os.

As políticas de enfrentamento às diversas formas de violência contra as mulheres não existem mais no âmbito nacional e em muitos estados e os equipamentos de atendimento as vítimas estão sendo reduzidos e os que ainda existem estão sucateados.

Reflexo disso é o aumento das violências contra as mulheres, que cresce de forma alarmante.

Entre janeiro e outubro de 2019, o Disque 180 registrou 3.664 denúncias de  feminicídios e de tentativas de feminicídios, um aumento de 272% em relação ao mesmo período de 2018.

Isso sem contabilizar diversos casos de assassinatos que não foram registrados como feminicídios ou mesmo aqueles casos de estupros em que as vítimas foram mortas.

Em contrapartida temos a extinção e desmonte dos equipamentos e programas de enfrentamento às violências contra às mulheres.

Há um aumento considerável das violências praticadas no âmbito doméstico. Cerca de 720 mulheres são agredidas por dia, ou seja, no Brasil é registrado 01 caso de agressão a mulher a cada 04 minutos, segundo o levantamento feito pelo Ministério da Saúde.

Não foge do padrão o aumento de violências sexuais: de acordo com o Anuário de Segurança Pública 2019, são registrados 180 estupros por dia, são mais de 66 mil casos por ano e essa só é a ponta do iceberg, já que estima-se que apenas 10% das vítimas denunciam. Os estupros coletivos estão se tornando mais comuns, em 2018 foram mais de 3800 casos registrados.

Vale ressaltar, também, o avanço de um feminismo construído pelo viés liberal, de replicação de atos e atividades que não dialogam com a realidade das mulheres brasileiras, muito menos com elas, um feminismo que não tem como centralidade o rompimento com o capitalismo, capitalismo que tem como seus pilares o patriarcado e o racismo.

Diante dessa realidade é imprescindível que façamos parte da construção e dos atos do 8 de março, que tenhamos como centro do debate a raiz do problema, a política de morte desse governo que impacta diretamente as vidas das mulheres trabalhadoras.

Compreender que o que estamos enfrentando não são pautas isoladas, mas sim uma reação em cadeia, nos trará uma construção que dialogará diretamente com a realidade das mulheres brasileiras.

Enfrentaremos dificuldades, principalmente, por divergências quanto a concepção de feminismo que queremos construir no Brasil e até a negação da construção dessa data. Todavia, a nossa participação deve ser focada na superação dos reais problemas das mulheres trabalhadoras, dentro da sua diversidade.

O 8 de março que devemos construir é para tempos de guerra!

(*) Wilma dos Reis integra o coletivo da secretaria nacional de mulheres do PT

 

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