Lula e a “invasão” da Igreja

Por Valter Pomar (*)

O companheiro Lula tem dado várias entrevistas.

Na manhã de terça-feira, dia 15 de fevereiro, Lula concedeu uma entrevista para a Rádio Banda B.

Nesta entrevista ele deu sua opinião sobre um episódio ocorrido recentemente em Curitiba (PR), envolvendo o vereador Renato Freitas (PT).

Transcrevo a seguir:

 “Ô Denise, voce sabe qual é a coisa mais importante da gente ter um pouco mais de idade? É que a gente já viveu determinadas coisas. A primeira coisa que eu queria dizer ao povo do Paraná é que o nosso vereador tem o direito de fazer protesto contra o racismo, agora o que ele não tem direito é de invadir igreja. O que ele não tem direito é de, sabe, entrar numa casa, sabe, religiosa, para fazer o seu protesto. Então ele tá errado. E se ele tá errado ele precisa humildemente entender que a palavra desculpa não é uma palavra que diminui a pessoa. A palavra desculpa engrandece quem tem a grandeza de pedir desculpas. E tem outros tipos de protestar, o nosso vereador deve ter aprendido que ele pode chegar ao padre e pedir pro padre fazer uma missa, sabe, pro povo negro de Curitiba, e lá protestar e homenagear os que fizeram a igreja. Ele pode inclusive pedir para que o bispo, ele é vereador, pode fazer um ofício ao bispo, pedindo pra aquela igreja ter um padre negro, ou dois padres negro. O que não tem sentido é invadir a igreja. O que não tem sentido é transformar o templo religioso, sabe, num lugar de protesto. Não foi correto, ele sabe que errou, agora também nós não podemos, sabe, eu sou contra pena de morte. Eu sei que tem muita gente “ah vamo cassar, vamo cassar, vamo cassar”. Não. Esse menino, por ser jovem, ele cometeu um abuso, ele portanto tem o direito de pedir desculpas, tem o direito de ser desculpado, tem o direito de ser perdoado, e quem sabe isso tenha sido a grande lição da vida dele. Pra ele perceber que o exercício da democracia que ele tem que fazer tem limite na hora que fere os interesses dos outros. é importante que ele saiba conviver assim. É importante que ele saiba que nunca mais ele adentre a um templo como forma de protesto, quando as pessoas estão lá tratando da sua espiritualidade, tratando da sua fé. Portanto, Renato, se você tiver me ouvindo eu queria te dizer, como um pai pode falar prum filho, sabe, você errou, se você errou, não persista no erro, humildemente peça desculpas. Peça desculpas ao povo do Paraná, peça desculpas ao PT, peça desculpas aos padres, aos religiosos, sabe, e nós vamos te defender, nós não vamos querer que você seja cassado, nós não vamos permitir que a direita conservadora da câmara te casse. Não. Quantas pessoas já erraram? Quantos absurdos acontecem na câmara todo dia? Quantas mentiras o Bolsonaro conta sobre religião todo santo dia? Não tem ninguém mais falso com a religião do que o Bolsonaro. Não tem ninguém que minta mais, olha só nos olhos do Bolsonaro quando ele fala em deus. Sabe, então, eu acho Renato, que é o seguinte: quando a gente erra, que a gente toma um tombo, a gente levanta sacode a poeira e dá a volta por cima. Você é muito novo, você tem muito a fazer por Curitiba, você tem muito a fazer pelo movimento negro, você tem muito a fazer no combate ao racismo, portanto, levanta sua cabeça querido, sabe, reconheça que você cometeu um deslize político, peça desculpas, e vamo tocar o barco pra frente. O partido irá lhe defender para que vc possa continuar com o seu mandato e exercendo as suas funções, porque só o povo é quem tem direito de cassar você”.

Do jeito dele, Lula buscou defender Renato Freitas e, ao mesmo tempo, se dissociar do que ele Lula considera ter sido um erro.

Não discuto ter ocorrido um erro (cair em tentação, digo, em provocação). Aliás, se não fosse assim, não estaríamos nessa polêmica.

Mas será que Lula acertou ao falar do erro que teria sido cometido?

O erro, nas palavras de Lula, teria sido “invadir igreja”, “entrar numa casa religiosa, para fazer o seu protesto”, “transformar o templo religioso, num lugar de protesto”. “que nunca mais ele adentre a um templo como forma de protesto, quando as pessoas estão lá tratando da sua espiritualidade, tratando da sua fé”.

Compreendo a situação e as preocupações de Lula, mas o conselho dele ao companheiro Renato Freitas incorre em dois desdobramentos preocupantes.

Primeiro desdobramento: implicaria em aceitar como verdadeira a acusação de que teria havido invasão e interrupção de culto.

Se tivesse havido, caberia a desculpa.

Mas não houve nem uma coisa nem outra, como nos explica entre outros – com base em argumentos fundamentados de uma maneira muito especial – o Padre Júlio Lancellotti:

https://www.brasildefato.com.br/2022/02/15/padre-lancellotti-diz-que-acusacoes-contra-vereador-de-curitiba-sao-invencionice-e-fake-news

Segundo desdobramento: implicaria em desconhecer parte importante do ocorrido.

A saber: um diácono da igreja foi grosseiro com os manifestantes. Estes obviamente não acharam graça nenhuma em ser enxotados, enxotados logo daquela igreja -a Igreja de Nossa Senhora do Rosário de São Benedito – e enxotados no contexto daquela manifestação.

E por isso resolveram entrar na Igreja, criando inadvertida mas previsivelmente o pretexto e as imagens usadas para falar em “profanação injuriosa”

Mas não houve “invasão”.

Aos interessados em mais detalhes, sugiro:

http://valterpomar.blogspot.com/2022/02/o-caso-renato-freitas.html

http://valterpomar.blogspot.com/2022/02/ao-fabio-venturini-sobre-o-ato-de.html

De resto, muito importante Lula dizer que o partido irá defender o mandato de Renato. O dele e de um sem número de militantes vítimas do mesmo modus operandi, não por terem cometido “erros”, mas pelo que representam.

(*) Valter Pomar é professor e membro do diretório nacional do PT

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